TEXTO CONVIDADO: MARA NARCISO


 
Dia oito de março é dia de gritar: “Abaixo a intimidação!”

Mara Narciso
Para José Geraldo Mendonça Júnior, Penninha Júnior

            Nasci com lábio leporino operado aos 30 dias de vida, canhota (meu avô era canhoto), magrela aos 14 anos e levemente acima do peso aos 16, carreguei por todos esses anos insultos e humilhações do meu irmão, que sempre me alcunhou de aleijada, trocada, garnizé, quando magra e vaca leiteira, quando gordinha. Isso vai muito além do bullying, e tem por intenção ridicularizar a pessoa, fazer com que se sinta humilhada, complexada, com o amor-próprio destruído, e não consiga levantar a cabeça para fazer nada. Mas é possível tomar uma atitude para sair do jugo de um tirano. O dia do enfrentamento precisa acontecer. E para isso é necessário coragem. Avancei para cima, derrubei a porta, o furei com uma caneta e levei um murro no olho. Esse foi o preço para nunca mais ser insultada.
            Uma costureira prima da minha mãe tinha treze filhos. O marido batia nela, e atacava as empregadas que trabalhavam na casa. Um dia ela bateu nele com um pau de lenha. Nunca mais ele a machucou. Quem sofre intimidações permanentes sabe como é difícil deixar para lá, não se sentir enfraquecido, reunir forças para abater o oponente, que pode ser um irmão, o chefe ou o marido, este o intimidador mais comum. Uma criança, um cão, uma pessoa portadora de deficiência pode sofrer com olhares, gestos ou palavras. A intimidação traumatiza e a psicanálise ajuda de forma exuberante.
            O intimidador inicia o seu cerco quando percebe a vulnerabilidade de quem é fraco. Quer ver medo nos olhos da vítima, e esta, pelos atos repetidos, se mostra tímida, com apreensão ou pavor. Algumas vivem apavoradas, sem apetite e sono. A intimidada muda de comportamento diante do algoz. Não é preciso que ele diga nada. A presença do criminoso faz a pessoa perseguida empalidecer ou enrubescer, emudecer e tremer. Até que um dia a libertação chega, nem sempre de forma civilizada, às vezes em furiosa explosão.
É crime e dá de um a três anos de detenção e multa para quem intimidar, constranger, ofender, castigar, submeter, ridicularizar ou expor alguém a sofrimento físico ou moral, de forma reiterada. Tal opressão, mais ligada às escolas, ocorre em todos os lugares. A denominação muda, conforme o tipo de agressão, podendo ser bullying, assédio ou constrangimento ilegal, mas a crueldade é a tônica, especialmente se a vítima é portadora de deficiência. Nesses casos, a reação poderá vir selvagem, com a lei tomando o lado do agressor inicial. É preciso que não se veja esses insultos como coisa normal e nem que se possa ignorá-los. As mulheres são os alvos mais frequentes.
O Dia Internacional da Mulher, o qual nós brasileiras do século XXI, livres e autônomas não gostamos, mas sabemos que neste instante há mulheres sendo espancadas, humilhadas, queimadas, envenenadas, estupradas, apedrejadas até a morte (punição de infieis e vítimas de estupro), outras tendo sua genitália externa amputada e costurada ainda crianças, algumas levando puxões de cabelo e pancadas em público, ou servindo de escravas sexuais em todo o mundo.
Neste um dia que nos coloca em situação de inferioridade, deixando nua a nossa condição de fêmeas, acorda nossas consciências de que há mulheres em situações que envergonham a humanidade. Muitas precisam de ajuda para sair do jugo de pais que as molestam, de maridos que as ameaçam, de chefes que causam constrangimentos de toda natureza. Que vigore a nova lei contra a intimidação, que faça par com a Lei Maria da Penha, para que o gênero feminino se realize de forma integral. Que brilhe em todos os desejos humanos, seja social, financeiro, materno, familiar, afetivo ou sexual, e que não sejam tratadas como mulheres, por serem mulheres, e sim por serem humanas, independentemente do gênero.
E não nos venham com discursos açucarados para tentar nos sensibilizar, como se todas as mulheres fossem anjos, pois não são, assim como nem todas são de cristal. Algumas têm a força de gigantes. As mulheres não são boas porque são mulheres, nem fracas por esse motivo. Há as boas e as más, as fortes e as fracas, há mães que são mães e outras que são madrastas. E a partir de hoje, as que querem sexo não sejam discriminadas por quererem sexo, e as que não o querem possam ser respeitadas por não o desejarem. Abaixo os estereótipos de insultos à mulher em seus vários calibres. E que o respeito possa ocorrer em todos os quadrantes.
07 de março de 2015

Comentários

  1. Obrigada, Márcia, pela divulgação das minhas ideias. Felizmente o dia 8 já acabou.

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