VIOLÊNCIA DOMÉSTICA: MUNICÍPIO É REFERÊNCIA em ACOLHIMENTO

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Município é referência em acolhimento


Texto e Fotos: Márcia Vieira

Sofia tem 14 anos, olhar levemente triste, sorriso tímido e uma maturidade desconcertante ao falar. Mas nem sempre foi assim. “Hoje a minha vida está bem melhor”, revela. A confissão tem explicação. Há cerca de dois meses, vivia uma vida agitada, bem diferente dos dias atuais. Em casa, assistia diariamente a cenas brutais de violência. O pai, dependente químico, agredia a mãe e a irmã menor. Quando interferia, Sofia também virava vítima. Hoje, ela vive ao lado da mãe e irmã na Unidade de Acolhimento  do  Município, referência em atendimento às vítimas de violência doméstica, na cidade e região.
“Histórias como essa são mais comuns do que se imagina, sobretudo quando há pouco esclarecimento e dependência econômica”, diz a assistente social Sarah Ferreira, que presta atendimento no local. Para ela, a agressão não ocorre do dia para a noite: “muitas vezes a mulher é agredida há tempos e nem sabe. Quando chega até aqui, é porque todos os seus limites foram esgotados”.
A Unidade está inserida na alta complexidade e é mantida com recursos do município. Única na região, a casa tem espaço para abrigar até 20 mulheres. Atualmente, são três acolhidas que recebem, além de repouso e alimentação, assistência médica, psicológica, jurídica, garantia de integridade física e muito carinho. O tempo de permanência é de até três meses, podendo ser prorrogado de acordo com a necessidade. Durante este período, os profissionais envolvidos buscam a família extensa, ou seja, parentes próximos na cidade ou fora dela, que estejam preparados e tenham condições de receber o familiar. Caso esta pessoa não seja encontrada, o município estuda alternativas para que as mulheres refaçam suas vidas e se reintegrem à sociedade. “A assistência não termina quando elas saem da casa”, declara Noemi Oliveira, coordenadora do lar. “Nós encaminhamos essas mulheres, incentivamos a buscarem emprego e trabalhamos para que elas sejam inseridas em políticas públicas adequadas a cada caso”, complementa.
Todas as que ali chegam são levadas pela Polícia Militar, parceira do município, depois de registrado um boletim de ocorrência de agressão que se enquadre na Lei Maria da Penha. Moradoras em idade escolar, como Sofia e sua irmã, são matriculadas e frequentam aulas regulares, cumprindo uma exigência da lei. As acolhidas são assistidas e preparadas para uma vida digna, quando saem da casa. “Mas para isso, é fundamental que elas queiram romper o vínculo com o agressor”, afirma Sarah. Num universo de violência doméstica, que cresce assustadoramente, dados apontam que apenas 5% das mulheres retornam à vida anterior de agressões.
 “Na outra casa quero ter paz!”, é mais uma confissão de  Sofia, ao final da conversa. Agora muito mais solta, com olhar esperançoso  e sorriso aberto. A “outra casa” a que ela se refere é a sua próxima morada, depois que sair da Unidade de Acolhimento. “Aqui é muito bom, acordo e durmo tranquila e até a aparência da minha mãe já melhorou. Mas quero voltar à vida normal de poder sair e conversar com as minhas amigas”. Sofia, que quer ser pediatra, provou que pode ajudar outras pessoas. O primeiro passo ela já deu. Buscou ajuda e salvou além dela mesma, a mãe e à irmã. O próximo passo é entrada no programa “Jovem Aprendiz”, que aguarda ansiosa.
Noemi se emociona ao relembrar uma das muitas histórias com final feliz: “Uma mulher chegou aqui grávida e já era mãe de outros cinco filhos. Sua estada foi um pouco mais prolongada porque não poderíamos deixar na rua alguém nesta situação. Aqui ela deu à luz e recebeu todo apoio necessário, do enxoval ao parto. Há poucos dias encontrei o seu filho mais velho, que inserido num programa para jovens, é tido como exemplo para os demais. Trabalhar aqui vale a pena. Com eles aprendemos a doar e a valorizar nossas vidas. Quando você faz algo por alguém se sente muito melhor. É gratificante”.
Para Sarah Ferreira, o sentimento é o mesmo: “oportunizar a quem está indo pelo caminho adverso é gratificante”.  Ela ainda faz um alerta: “é preciso trabalhar a legislação para que os agressores sejam realmente punidos. E é necessário também que as mulheres nesta situação saibam que elas tem um ponto de apoio, que o equipamento público fornece este amparo”, finaliza.

Comentários