TEXTO CONVIDADO: MARA NARCISO
Correios:
a instituição mais confiável do Brasil
Mara Narciso
“Não
se afobe não, que nada é pra já, o amor não tem pressa, ele pode esperar no
silêncio do fundo do armário, na posta-restante. Milênios, milênios no ar...”
(Futuros amantes - Chico Buarque). Posta-restante é um sistema de envio de
correspondência em que esta não é enviada para o endereço do destinatário,
ficando nos correios até que a reclamem.
Revolver
o passado para analisá-lo traz inúmeras vantagens, desde a motivação dada pelos
acertos, até o aprendizado trazido pelos erros. A Empresa Brasileira de
Correios e Telégrafos surgiu em 1663 com a criação do cargo de Correio-mor das
cartas do mar no Rio de Janeiro. Depois teve por objetivo enviar e entregar
correspondências, além de desenvolver a Filatelia – o selo Olho de Boi de 1843
faz parte da primeira série de selos postais impressos pelo Governo Imperial
Brasileiro. As encomendas podiam ser levadas a pé, em lombo de burro, carroças,
de barco, de trem, de ônibus, de avião e outros meios de transporte.
As
antigas agências dos Correios tinham grandes mesas sobre as quais se fazia a
colagem dos selos e o fechamento dos envelopes e pacotes. Eram de madeira, e
tinham um recipiente fundo, abaixo do nível da plataforma, com cola amarela e
uma espécie de rolo de metal, que girava mergulhado no líquido e nele se
encostava a extremidade do envelope a ser fechado. A mesa era toda melada, e
exalava um odor característico. Após comprar o selo, de acordo com o peso do
material a ser enviado, havia o costume de se lamber a parte posterior da
estampa que seria aderida. Depois de serem colados, os selos recebiam um
carimbo, e a carta era colocada num buraco de entrada estreita, dentro de um
balcão de mármore. Na época do Natal os Correios fervilhavam.
Enviar
uma carta, imaginar o destinatário lendo, respondendo e aguardar a chegada da
resposta envolvia expectativa e emoção. Era aflitivo aguardar pela hora do
carteiro passar, vê-lo se aproximar da casa, receber o envelope e ir ler a
mensagem num lugar reservado, para não dividir a alegria com ninguém. Ou a
tristeza das más notícias.
Na
década de 1970 era possível enviar uma carta de Montes Claros a São Paulo e
esperar duas semanas para se ter a resposta. Ou nunca tê-la. Cartas extraviadas
eram comuns. Pessoas com muita correspondência tinham sua caixa postal. Era uma
espécie de box numerado com duas portas de metal, uma para o exterior e outra
para o interior, que ficava nas paredes das agências. O dono da caixa pagava
uma mensalidade, tinha a chave externa e os funcionários possuíam a interna
para colocar as cartas e afins. Sendo freguês habitual, as empresas enviavam ao
proprietário catálogos com fotos de produtos.
Havia
cursos por correspondência, inclusive em nível superior. Ao final do estudo,
havia a prova e o diploma. Com o tempo, outros serviços foram incorporados, com
modernização tecnológica, ampliação do seu papel social (patrocínio de atletas)
e uma logística que ganha prêmios. O SEDEX - Serviço de Encomendas Expressas
surgiu em março de 1982 para fazer entregas de pacotes de até 5 kg.
A
pesquisa Marcas de Confiança das Seleções do Reader’s Digest em 2008, para
avaliar a credibilidade das pessoas nas entidades, teve como vencedora os
Correios com 86% de confiança, mas, essa certeza foi estremecida por escândalos
protagonizados pela sua direção. Atualmente não figura entre as marcas em
que a população dá mais crédito. De acordo com a Folha de São Paulo de 7 de
junho de 2017, uma pesquisa mostrou que 83% dos brasileiros confiam nas Forças
Armadas, 71% na Imprensa, 33% na Presidência da República e 30% nos partidos
políticos.
Os
Correios perderam a sua função inicial, já que quase ninguém espera por cartas
– apenas por contas, boletos e propaganda política. As missivas foram
substituídas pelos e-mails, hoje em menor número, já trocados pelas mensagens
de texto, de voz e de vídeo das redes sociais. Podemos, mas não devemos
reclamar dos avanços. A saudade acontece já que a nostalgia ainda não foi
proibida.
13
de julho de 2018