TIÃO MARTINS E MARA NARCISO
A mentira é uma coisa que me intriga. É uma opção tão mais perigosa e escravizante para aqueles que escolhem viver debaixo das suas asas! É um faceta misteriosa do ser humano, pois ao contrário do que dizem, falar a verdade é mais saudável, não te torna refém de nada nem de ninguém, não escraviza, não coloca amarras. Chega a ser um pouco egoísta, já que ao dizer a verdade, o problema passa a ser do outro. Mas é indiscutivelmente, na minha opinião, a melhor ou única opção, além de ser justa para com o outro. E foi a partir desta inquietação, e de tanto ouvir ( e nunca entender) que "as coisas não podem ser ditas do jeito que se pensa", que propus a dois amigos muito especiais, de quem gosto particularmente como pessoas e como escritores, que desenvolvessem um texto a partir do tema: VERDADE- PORQUE GOSTAR DESTE MISTÉRIO.
E eles, legais que são comigo(e com os nossos leitores), atenderam prontamente ao meu pedido. Com isso, os leitores do blog tem a oportunidade de desfrutar de dois textos ótimos, serenos e exclusivos sobre um tema complexo e cheio de nuanças. A seguir, os textos do TIÃO MARTINS (tiaomartinsbh.com ) e da MARA NARCISO. SABOREIEM:
Verdade sem mistério
Tião Martins
Boa parte dos equívocos humanos vem da busca de uma verdade qualquer: uma crença,
uma religião, um dogma, um herói.
Queremos verdades simples, sem mistérios e sem enganos. Qualquer coisa parecida com o paraíso,
sem a serpente e o final infeliz.
Pigmeus na busca da razão e da verdade, cometemos muitas vezes o equívoco de confundir desejo e realidade.
Como queremos que o mundo seja um lugar propício à vida, apagamos do quadro tudo que contradiz nosso desejo. E abraçamos a ficção.
É isso que os marxistas de carteirinha chamam de alienação, embora eles próprios vivam no fundo de um poço, com os olhos voltados para o passado.
A verdade, por mais que isso machuque o nosso ego, é algo que teremos que buscar longe dos desejos e crenças infanto-juvenis.
Longe dos manuais, das velhas crenças, das histórias que ouvimos dos avós.
Longe das ideologias simplificadoras e das palavras de ordem dos partidos políticos.
Longe de nós, enfim.
É por isso que tão poucos insistem em buscá-la. E um número ainda menor chega a se aproximar dela.
Não se chega à verdade sem demolir os mistérios falsos ou verdadeiros que encontramos no caminho.
E nessa jornada haverá equívocos, tropeços e recuos. E aqueles que se aproximam dela – da verdade – ainda correm o maior de todos os riscos: acreditar que é a única, a última, a definitiva.
São tantos os desvios, tantas as armadilhas, que a maioria desiste da jornada e amarra o seu barquinho no primeiro cais.
Melhor seria que afundassem o barco e destruíssem o cais. Acontece que os humanos valorizam mais a segurança que a busca eterna.
E não há segurança, nem certeza, para quem busca a verdade. Só existe a busca, até o apito final.
Mara Narciso
Falar da verdade, um tema complexo, precisa envolver outros anexos como injustiça e sinceridade. O que é a verdade?
Nem Cristo animou-se a explicá-la. Portanto, é um mistério que alguns odeiam, enquanto outros amam, fazendo dela uma razão para enfrentar o mundo. Cada um teria a sua própria verdade, e esta seria imutável pela vida, ou flexível conforme a moda e as circunstâncias? Quando a verdade alheia nos é favorável, é bom ouvi-la, mas quando nos é negativa, escolhemos esquecê-la, ou alterá-la, quando possível.
Muitos preferem a amarga verdade, que a doce mentira, porém Cazuza disse: “mentiras sinceras me interessam”. A verdade necessária é bem-vinda, e de preferência, que entre de supetão. Essa de preparar o espírito para uma notícia ruim soa mal para a minha sensibilidade.
Se por um lado “onde tem fumaça tem fogo”, por outro “as aparências enganam”. Mas, para quem quer agir na base da suposição e praticar a maledicência, a verdade pouco importa. Age como autor de ficção, colocando ingredientes vis para obter maior platéia. E atinge seu intento. Raramente há quem parta em defesa do injuriado ausente.
Será que somos capazes de ouvir e praticar a verdade sincera e desinteressada? A franqueza educada é bem-vinda, mas agimos de forma imparcial? Então, entra em cena a coragem. Conseguimos opinar contra o senso-comum para sermos fieis à nossa verdade? Por medo de perdermos privilégios, podemos omitir nosso pensamento.
Mas, compensa enganarmos os demais, falando o que querem ouvir, por comodismo, sendo que desejássemos dizer outra coisa? Sou contra mentiras, e omitir pode ser questão de sobrevivência. “Viver é perigoso”, disse Guimarães Rosa, e ser verdadeiro adiciona maior risco a existência. Entre os perigos da vida, amar tem alta voltagem, porém, para o nosso pavor, atrelada ao amor pode estar de tocaia a maior dor que um ser humano pode sentir: a perda. Então, muitos preferem ocultar sentimentos.
Então, enquanto há os que não amam por medo, há os que mentem por igual motivo. Ir pela contramão do senso-comum, chega a ser estupidez em várias situações. Ainda assim, ser verdadeiro é virtude que deve ser estimulada. Dizer frases do tipo “eu minto, eu omito, eu crio histórias” deve ser figura folclórica, apenas para fazer graça. Peca-se por atos e omissões, e mata-se o amor e a amizade pelas mesmas armas. Nada é mais covarde que injuriar, caluniar e difamar. Para quem age assim, melhor ordenar ao grupo uniformizado: “pelotão, atenção, preparar, fogo!” Nem que seja de maneira metafórica. E que a verdade prevaleça.
Bem, só me resta agradecer ao desprendimento deste dois amigos queridos, que além de enriquecer o blog, trazem à baila reflexões importantes, acerca de um tema aparentemente simples, mas carregado de inquietações.
Obrigada amigos! E aos leitores, desejo que depois da leitura, se sintam enriquecidos.
Agradecida, Márcia, pela oportunidade de me manifestar num tema tão palpitante quanto é a V E R D A D E junto a uma companhia tão marcante e sábia, como é Tião Martins. Muito obrigada!
ResponderExcluirObrigada, eu, Mara! Valeu. Os textos, seu e do Tião, ficaram ótimos, trataram de forma serena o assunto e enriqueceram o espaço.
ResponderExcluirBjo grande e obrigada!
Márcia