TEXTO CONVIDADO II- MARA NARCISO
Não espere quase ir desta para uma melhor para mudar
Mara Narciso
O setor musical está cheio de alusões a mudar, recomeçar, refazer. Diante
da insatisfação, a mudança é uma das mais frequentes vontades, em relação a si
próprio e aos que estão perto, depois da busca pela felicidade. “De hoje em
diante/ vou modificar o meu modo de vida/ naquele instante que você partiu/
destruiu nosso amor/” (Roberto Carlos).
Quando a falta
de virtudes predomina, a pessoa anseia pela modificação. Em geral ela vem, mas
nem sempre para melhor. Muitas vezes os defeitos vão se ampliando com os anos.
Mas, deixando o pessimismo de lado, há quem consiga mudar tudo, e o que a fazia
sofrer passa a fazê-la crescer. Outros, num momento de raiva, e em tom de
ameaça, dizem que desejam sumir. Essa vontade, que de vez em quando é
concretizada, significa cansaço de si mesmo e da rotina que leva. Sentindo-se
asfixiado, amarrado e cego, quer outra vida, algo diferente. Então foge,
desaparece, algumas vezes para sempre, engrossando o rol de desaparecidos. Evite
extremos. Tome decisões factíveis antes disso.
Começar de
novo, de Ivan Lins inicia-se assim: “Começar de novo/ e contar comigo/ Vai valer
a pena/ Ter amanhecido/ Ter me rebelado/ Ter me debatido/ Ter me machucado/ Ter
sobrevivido/ Ter virado a mesa/ Ter me conhecido/ Ter virado o barco/ Ter me
socorrido//” Cada um a seu modo canta por mais coragem e espera por
novidades.
Para buscar
outra vida, é preciso abandonar a que existia até então. Muitas histórias são
contadas dentro da seara religiosa, por pessoas que foram alcoólatras ou
dependentes químicos, e que se converteram a uma religião, começando uma nova
existência, largando o que acreditavam (ou desacreditavam) e que viviam para vir
a ser uma nova pessoa. Dentre as mudanças radicais, há os que perdem 50 quilos e
outros que mudam de gênero. Raul Seixas disse
em Tente Outra Vez :
“Beba! (Beba!)/ Pois a água viva/Ainda está na fonte/ (Tente outra vez!)/ Você
tem dois pés/ Para cruzar a ponte (...)Tente outra vez!//”
Algumas transformações, pelo menos para o público consumidor, acontecem
no formato inicial de vida desregrada, excessos extremos, prática da nudez
vulgar e até crimes de morte, para um modo monástico de viver. Argumenta-se que
todos merecem uma segunda chance, um voto de confiança após um erro (ou vários
deles). Os testemunhos surgem após situações de quase morte. A televisão bebe
nessa fonte, e ex-atrizes dançarinas contam como se deram as revelações e as
conversões. Renegar o passado é a tônica desses casos. Ainda que se queira
colocar um concreto forte em cima, a pessoa é agora a soma do que foi e fez
antes.
Muitos só encontram forças para mudar, quando estão próximos da morte.
Mencionam um período de reflexão e iluminação, e, quando se recuperam, falam em
mudanças, com destaque para os valores, que, entenda-se, eram os cifrões
(ostentação, dinheiro, poder e fama) e passam a ser as ações e sentimentos. A
conversa é semelhante. Os bens materiais tornam-se secundários, e surgem gestos
de solidariedade, da prática do bem, de respeito ao outro, de melhor compreensão
do sofrimento alheio.
Que seja praticado o mudar hoje, para amanhã ser o segundo dia, em lugar
de adiar indefinidamente. Abandonar a omissão, olhar pelos outros, acolher,
entender, evitar ações e sentimentos destrutivos para si e os demais deveria ser
a norma para agora, e jamais deixado para o limite final. E que não se espere
por doenças graves para visitas de arrependimento ao passado. O sentimento de
culpa não deve ocupar tempo nenhum da existência.
O lugar do hospital onde se nasce é a maternidade, mas onde se renasce
pode ser o CTI. Não deixe que isso aconteça com você. Antecipe-se!
25 de abril de
2015
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