Por Wanderlino Arruda
Na foto, YVONNE discursa pela última vez no planeta terra, em lançamento de livro(Foto: Márcia Vieira) |
Não
basta crer e saber, é necessário viver a nossa crença, isto é, fazer
penetrar na prática cotidiana da vida os princípios superiores que
adotamos.
Léon Denis
Léon Denis
Yvonne
de Oliveira Silveira é de Montes Claros e veio ao mundo em 30 de
dezembro de 1914, numa casona de esquina das Ruas Padre Augusto/Doutor
Santos, onde agora reina o Banco Itaú. Tempo bom de infância de Cândido
Canela, Mário Veloso, Waldir Bessone, Raul Peres, Ciro dos Anjos,
Felicidade Tupinambá, tempo de suas amigas Walkiria Teixeira, Zuleica,
Luíza Froes, Dora dos Anjos, Idoleta e Maria Maciel. Tempo de seu futuro
namorado, noivo e marido Olyntho Silveira. Tem duas origens
interessantes: da família Peres, de tradição montes-clarense e do sangue
alemão do seu pai Antônio Ferreira de Oliveira, lourão de olhos verdes,
sobrenome brasileiro, porque traduzido. Teve sete irmãos: Wilson,
Lívio, Zilda, José Laércio, João Hamilton, Paulo Nilson e Nilza. Muitos
tios: Alexina, Francisco, Levy, Iracy, Raul, Rubens, Zelândia e Zélia.
Francisco era o famoso Cica Peres. Raul, é o doutor Raul Peres, agora
chegando aos 104.
Foi
criada pertinho do Largo de Cima, conhecedora perfeita da Praça Doutor
Carlos, ouvinte de todo o barulho de fereiros e de animais amarrados em
moirões e palmeiras. Foi sempre uma alegria de menina que vivia entre
canteiros de flores e hortas de alface, brincadeiras de quintal e de
rua, com estórias dos mais velhos no escurecer da boquinha da noite,
assentados na calçada. O tempo corria lento, marcado pela posição do sol
e pelo sino do relógio da torre do mercado, um batido musical para cada meia hora e tantas e tantas pancadas coerentes com o número do mostrador; meio-dia e meia-noite, claro com doze lindas sonoridades. O que não era poeira do chão, era boniteza colorida dos pequis, dos cachos de banana, dos sacos de laranja, dos bacuparis e das pitangas, das carnes penduradas e cheirosas pingando gordura. Tudo, tudo entre a realidade e os sonhos.
e pelo sino do relógio da torre do mercado, um batido musical para cada meia hora e tantas e tantas pancadas coerentes com o número do mostrador; meio-dia e meia-noite, claro com doze lindas sonoridades. O que não era poeira do chão, era boniteza colorida dos pequis, dos cachos de banana, dos sacos de laranja, dos bacuparis e das pitangas, das carnes penduradas e cheirosas pingando gordura. Tudo, tudo entre a realidade e os sonhos.
Agora
Dona Yvonne – assim eu a sempre tratei mesmo como colega de faculdade -
vive seu centenário e faz a vida se transformar em obra de arte. Sempre
parecendo que saiu do banho, cabelo arrumado, perfume de mãos que
oferecem flores, seu olhar é de quem ama mais do que tudo a existência.
Em Yvonne Silveira, nada mais condizente que as palavras de Emmanuel
construídas no sonho e concretizadas no amor: “Duas asas conduzirão o
espírito humano à presença de Deus: uma chama-se AMOR, a outra,
SABEDORIA. Pelo amor, que, acima de tudo, é serviço aos semelhantes, a
criatura se ilumina e aformoseia por dentro, emitindo, em favor dos
outros, o reflexo de suas próprias virtudes; e, pela sabedoria, que
começa na aquisição do conhecimento, recolhe a influência dos
vanguardeiros do progresso, que lhe comunicam os reflexos da própria
grandeza, impelindo -a para o Alto”.
O
Curso de Letras, o primeiro em nível superior em Montes Claros, teve
início no Colégio Imaculada Conceição, em 1963, teve matrícula de 52 e
formatura de somente sete: Yvonne, Saturnino, Hugo, Adilson, Lola, Irmã
Guiomar e Wanderlino. Quando o terminamos em 1967, para sermos
professores universitários em nossa própria escola, Yvonne e eu tivemos
de seguir para a pós-graduação na Universidade Católica de Minas Gerais,
ela na especialização em Teoria da Literatura, eu em Linguística Geral,
isso além de termos de prestar exames de suficiência, ela na
Universidade Federal em Belo Horizonte, eu na Federal de Juiz de Fora,
porque o registro da Fafil iria demandar ainda algum tempo. Já com muita
prática no ensino de Português e de Literatura, fomos na área os
primeiros a preparar
futuros alunos e candidatos ao vestibular. Daí, da cátedra e da titularidade de professores, vivemos entre importantes gerações de estudantes que, hoje, marcam o jornalismo, a vida social, a batalha política e cultural em várias partes deste Brasil. Fico encantado quando um aluno de Yvonne marca lembranças de suas aulas, principalmente por recordar cada minuto do entusiasmo dela, principalmente das muitas palavras de incentivo à leitura e à escrita. Como a sua estreia no magistério foi aos doze anos, ela teve no mínimo oitenta e oito de oportunidades para despertar vocações, quase um século de benfazeja prestação de serviços à cultura.
futuros alunos e candidatos ao vestibular. Daí, da cátedra e da titularidade de professores, vivemos entre importantes gerações de estudantes que, hoje, marcam o jornalismo, a vida social, a batalha política e cultural em várias partes deste Brasil. Fico encantado quando um aluno de Yvonne marca lembranças de suas aulas, principalmente por recordar cada minuto do entusiasmo dela, principalmente das muitas palavras de incentivo à leitura e à escrita. Como a sua estreia no magistério foi aos doze anos, ela teve no mínimo oitenta e oito de oportunidades para despertar vocações, quase um século de benfazeja prestação de serviços à cultura.
Disse
muito bem Charles Chaplin que a vida é uma peça de teatro que não
permite ensaios. É preciso que a gente cante, ria, dance, chore e viva
intensamente cada momento, antes que a cortina se feche e a peça termine
sem aplausos. Acrescenta Fernando Pessoa que o valor das coisas não
está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. E é
por isso que existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e
pessoas incomparáveis. Não seria exagero dizer que os dois mestres – sem
conhecer Yvonne Silveira - escreveram isso tempos atrás baseados num
modelo nela inspirado ou que ela inspira. Neste momento em que escrevo,
ela está comemorando e ajudando a comemorar o Dia Internacional da
Mulher, desfilando nobremente num escaldante sol de Verão, por vontade
própria e atendendo a um convite do Rotary de Montes Claros-União. Estou
quase certo de que ela estará sendo fotografada e dando uma entrevista
para os repórteres da TV e apresentando ideias para a moçada dos jornais
e das rádios. Voz de moça de trinta anos, com toda uma lógica no
raciocínio e uma perfeita coerência de ideias. Numa rara queixa esta
semana, ela me disse, por telefone, que acha que está envelhecendo, pois
se vê distraída, sentindo umas tonteiras e tendo dificuldade para subir
escadas. Claro que velha seria a avó dela se ainda estivesse viva.
De
publicação, Yvonne Silveira tem Montes Claros – Crônicas,“Cantar de
Amigos - Poemas, História do Elos Clube de Montes Claros, Montes Claros
de Ontem e de Hoje, e Folclore para Crianças, (em parceria com Zezé
Colares) e Brejo das Almas – Contos e Crônicas, livro dela e do marido
Olyntho Silveira. Foram muitos e muitos os prefácios para livros de
amigos,
muitas as análises literárias, muitos poemas e crônicas, muitas as peças para apresentações de teatro. Professora de tudo quanto é escola em Brejo das Almas e em Montes Claros, nunca houve na sua vida um dia de desemprego, trajetória do ensino primário até a eficiência universitária. O cargo talvez mais elevado entre os muitos que tem exercido seja o de Diretora da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Norte de Minas, nossa querida Fafil. Isso sem falar que foi professora de História das Artes no Conservatório Estadual de Música Lorenzo Fernandez, ao tempo de D. Marina. Presidente da Academia Montesclarense de Letras desde 1985, nunca teve vontade de deixar o cargo, nem vai deixá-lo, dizendo-se sempre influenciada por Austregésilo de Athayde, da Academia Brasileira de Letras, e por Vivaldi Moreira, da Academia Mineira, que tiveram mandatos infinitos e existenciais. Só aos quase cem anos, ela admitiu passar o cargo para “alguém mais novo/a”, acredito uma grande conversa da boca para fora, porque de alma sempre nova, ela sempre sentiu a perpetuidade do seu mandato. Iluminar, iluminar tudo, iluminar todos, iluminar sempre, esse é o seu lema, essa a sua trajetória, esse o seu dever, o que entende por sua missão.
muitas as análises literárias, muitos poemas e crônicas, muitas as peças para apresentações de teatro. Professora de tudo quanto é escola em Brejo das Almas e em Montes Claros, nunca houve na sua vida um dia de desemprego, trajetória do ensino primário até a eficiência universitária. O cargo talvez mais elevado entre os muitos que tem exercido seja o de Diretora da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Norte de Minas, nossa querida Fafil. Isso sem falar que foi professora de História das Artes no Conservatório Estadual de Música Lorenzo Fernandez, ao tempo de D. Marina. Presidente da Academia Montesclarense de Letras desde 1985, nunca teve vontade de deixar o cargo, nem vai deixá-lo, dizendo-se sempre influenciada por Austregésilo de Athayde, da Academia Brasileira de Letras, e por Vivaldi Moreira, da Academia Mineira, que tiveram mandatos infinitos e existenciais. Só aos quase cem anos, ela admitiu passar o cargo para “alguém mais novo/a”, acredito uma grande conversa da boca para fora, porque de alma sempre nova, ela sempre sentiu a perpetuidade do seu mandato. Iluminar, iluminar tudo, iluminar todos, iluminar sempre, esse é o seu lema, essa a sua trajetória, esse o seu dever, o que entende por sua missão.
Yvonne
e Olyntho realizaram, lá pela meia idade, uma mais do que querida
adoção. Receberam, com muita alegria, Ireni, Ireni Mota Carlos, que lhes
deu dois netos: Maria Luíza e Pedro Vinícius. O nascimento de Maria
Luíza Oliveira Silveira foi elegantemente comemorado com um soneto de
Olyntho, um dos mais bonitos que ele escreveu. De Maria Luíza, curso
superior de Enfermagem, casada com Leandro Pimenta Peres, nasceu o
bisneto Vinícius Silveira Peres, que já anda como rapaz, dá recados e
faz as honras da casa quando chega uma visita. Moram todos numa linda
mansão da Rua Basílio de Paula, que liga a Vila Brasília ao Bairro Todos
os Santos, desculpem-me a falta de modéstia, uma área das mais nobres.
Para a época de antanho do casamento, em Brejo das Almas, Olyntho e
Yvonne se uniram já bem coroas (76 anos de vida em comum), ele com 23,
ela com 18. E só se casaram depois de quatro anos de namoro, porque
Olyntho não lhe dava sossego, passando dia e noite de bicicleta em
frente à casa de D. Cândida e Niquinho Oliveira, seu pai. Por falar em
Niquinho, é bom dizer que ele, na verdade, tinha um nome de literato e
de orador e dois apelidos como farmacêutico, um no Brejo, outro em
Montes Claros: o normal era Niquinho Oliveira. O outro, que lhe foi
posto por Joaquim Sarmento, um dos seus melhores amigos, era Niquinho
Açúcar, só usado pelos mais íntimos. E por que Ninquinho Açúcar? Havia,
na Camilo Prates, da Padre Augusto até a Praça Doutor Carlos, dois
Niquinhos farmacêuticos: Niquinho Teixeira e Niquinho Oliveira. O
Oliveira, louro e brancão, como disse antes, de olhos verdes; o
Teixeira, um tanto quanto amorenado. Para distinguir melhor, Joaquim
Sarmento apelidou-os de Niquinho Açúcar e Niquinho Rapadura, ficando
assim bem mais clara a identificação. Yvonne e eu somos da fundação do
Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros. Ela tem como patrono o
pai farmacêutico Antônio Ferreira Oliveira e eu, o farmacêutico Antônio
Augusto Teixeira, ambos fundadores do Rotary de Montes Claros em 1926, o
terceiro clube rotário do Brasil.
Quando
não era ainda normais as viagens para outros países, Dona Yvonne fez
duas aventuras na Europa. A primeira em 1981, lembro-me muito tendo de
memória os comentário do seu companheiro de turismo, Lazinho Pimenta. A
segunda em 1991, com um turma de amigas, um mês inteiro percorrendo
Portugal, depois de participar como representante brasileira em uma
Convenção do Elos, no Faro, quando D. Fernanda Ramos
era presidente internacional. Sem dúvida, fizeram muito sucesso, bela apresentação do elismo brasileiro, principalmente do nosso Elos Clube de Montes Claros, que sempre esteve na vanguarda. Desejo lembrar também aqui da admissão de Dona Yvonne na Academia Montesclarense de Letras, juntamente com Simeão Ribeiro Pires, Olyntho Silveira, Cândido Canela e Sílvia dos Anjos, primeira turma convocada para se unir aos fundadores Alfredo Marques Vianna de Góes, João Valle Maurício, Joaquim Cesário dos Santos Macedo, Francisco José Pereira, Orlando Ferreira Lima, Heloísa Neto de Castro, Antônio Augusto Veloso, Maria Ribeiro Pires, Dulce Sarmento, José Raimundo Neto, Hélio Oscar Valle Moreira, Avay Miranda e Geraldo Avelar. A curiosidade é que os criadores da Academia não queriam
ter patronos, privilégio que ficaria para eles mesmos, quando morressem. Foi Yvonne Silveira que os convenceu a adotar a prática normal.
era presidente internacional. Sem dúvida, fizeram muito sucesso, bela apresentação do elismo brasileiro, principalmente do nosso Elos Clube de Montes Claros, que sempre esteve na vanguarda. Desejo lembrar também aqui da admissão de Dona Yvonne na Academia Montesclarense de Letras, juntamente com Simeão Ribeiro Pires, Olyntho Silveira, Cândido Canela e Sílvia dos Anjos, primeira turma convocada para se unir aos fundadores Alfredo Marques Vianna de Góes, João Valle Maurício, Joaquim Cesário dos Santos Macedo, Francisco José Pereira, Orlando Ferreira Lima, Heloísa Neto de Castro, Antônio Augusto Veloso, Maria Ribeiro Pires, Dulce Sarmento, José Raimundo Neto, Hélio Oscar Valle Moreira, Avay Miranda e Geraldo Avelar. A curiosidade é que os criadores da Academia não queriam
ter patronos, privilégio que ficaria para eles mesmos, quando morressem. Foi Yvonne Silveira que os convenceu a adotar a prática normal.
Neste
grandioso 2014, ano de seu centenário, estaremos em constante festa,
preparando e comemorando juntamente com ela todas as glórias que Deus
lhe permitiu. Ana Valda Vasconcelos, representando o Elos Clube,
Maristela Cardoso planejando pelos artistas, e eu, como presidente do
Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros, estamos nos reunindo
com muitas instituições para realizarmos importantes reuniões festivas.
Elos Clube, Academias de Letras, Instituto Histórico e Geográfico,
Rotary, Conservatório, Fundação Marina, Ateliê Felicidade Patrocínio,
Associação dos Artistas Plásticos, Automóvel Clube, Câmara Municipal e
Assembleia Legislativa. As duas maiores manifestações deverão ser da
Reitoria da Unimontes e da Secretaria de Cultura. O Reitor João dos Reis
Canela já está preparando sua festa para o mês de maio.
Clássica
e renascentista, sempre antenada a cada tempo,é Yvonne Silveira
conservadora ao máximo, alma de absoluta mineiridade. Intelectual tanto
dormindo como acordada, será sempre um dos símbolos de Montes Claros e
de Francisco Sá, seu saudoso Brejo. Ontem como hoje teve e tem uma
multidão de admiradores e de amigos. Deo gratias!
__________________Presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros e da Academia Maçônica de Letras do Norte de Minas.
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