TEXTO CONVIDADO:
MARA NARCISO
O
lado bom da força
Mara Narciso
Quando
começaram os movimentos de rua no Brasil em 2013, quem endossou tal movimento e
o conduziu? Paulo Henrique Amorim apresenta a tese de que tenha sido a Rede
Globo, que politizou o movimento que, inicialmente, brigava com Fernando
Haddad, prefeito de São Paulo, por ter majorado o preço dos coletivos em 20
centavos. “O som rouco das ruas” cresceu, e foi direcionado (por quem?) contra
Dilma Rousseff. A presidente foi deposta por alegadas “Pedaladas Fiscais”, uma manobra
contábil e ódio e intolerância alastraram-se, passando a ecoar com mais força a
cada dia. Em cada ação uma contabilização política.
A
vereadora do PSOL Marielle Franco foi assassinada no dia 14 de março de 2018,
por defender as minorias, denunciar arbitrariedades e ser contra a Intervenção
Federal, de configuração militar, numa execução impetrada por forças que a
queriam calar. O resultado foi uma multiplicação de vozes insatisfeitas com o
tratamento que a sociedade dá aos negros pobres, especialmente mulheres. As
qualidades de Marielle foram enaltecidas pelo Fantástico, seguindo a onda do
senso comum, que estava revoltado com aquela morte que foi capa do jornal
americano Washington Post e outras publicações internacionais. O tamanho
de Marielle está aos olhos de todos, ainda que tenha ocorrido um movimento
difamatório das redes sociais e a Rede Globo venha despolitizando o crime,
argumentando que a Intervenção Federal no Rio precisa ser ampliada, defendendo
aquilo que Marielle combatia
.
A
desembargadora Marília Castro Neves, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
afirmou no Facebook que Marielle estava “engajada com bandidos, e que foi
eleita por uma facção criminosa”. Perguntou o que uma professora com Síndrome
de Down poderia ensinar aos seus alunos. É reincidente, pois em 2015 disse: “Sou a favor de um paredão profilático para
determinados entes... o Jean Wyllys, por exemplo, embora não valha a bala que o
mate e o pano que limpe a lambança, não escaparia do paredão”. A
apologia ao ódio está nesse grau. Muitos perfis verdadeiros defendem essas
mesmas ideias.
Quando
pensamos fazer nossas escolhas, não as estamos fazendo, estamos sendo
manipulados por quantas forças há. O que de fato somos?
Sabemos
da necessidade da normatização da cidade. Não é possível que seja cada um por
si. Há regras civilizatórias para nos organizar, com leis municipais, estaduais
e federais. Não há nada tão incontrolável quanto uma multidão. No dia 21 de
março de 2018, na praça Dr. Carlos Versiani, centro nervoso de Montes Claros,
cidade mineira com mais de 400 mil habitantes, aconteceu uma atitude coletiva
inesperada. Ali é ponto final da maior parte dos ônibus, tendo ambulantes
vendendo alimentos em condições sanitárias precárias. Chegaram fiscais da
Prefeitura para autuar vendedores, que, pelo Código de Postura do Município
estavam ilegais. Numa ação repetida para sanear o local, vendedores foram
convidados a entregar suas mercadorias. Leonardo Ferreira Barbosa, de 43 anos,
ex-morador de rua em São Paulo e ex-dependente químico, foi um dos abordados
pelos fiscais. Como se houvesse um maestro, as pessoas foram cercando o homem,
que, atônito, num instante vendeu todos os sucos e coxinhas. Muitos transeuntes
chegaram até ele, e, entregando-lhe o dinheiro, pegavam os produtos um a um,
ordeiramente, enquanto diziam frases como “deixem o trabalhador em paz”, “não
façam isso com um pai de família”.
A
mercadoria desapareceu, o homem encheu sua mão de notas, e chorou comovido,
enquanto os fiscais atordoados, não sabiam o que fazer. A atitude da população
anônima de Montes Claros ensinou que ser solidário é possível. Uma onda boa,
sem o comando de ninguém, apenas a consciência de cada um fez justiça.
Exatamente quando o ódio e a intolerância atingem seu nível máximo, o bem
venceu o mal. E o mundo todo ficou sabendo da boa índole do povo
montes-clarense.
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